Documento "Direito à comunicação e informação para consolidar a democracia e o direito à saúde"


05/11/2015
Equipe PenseSUS


 

Contribuições para a 15ª Conferência Nacional de Saúde

Documento
Direito à comunicação e informação para consolidar a democracia e o direito à saúde

 

Como resultado do I Diálogo PenseSUS – Democracia, comunicação, informação e direito à saúde: Mobilização para a 15ª Conferência Nacional de Saúde, realizado pelo Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde da Fundação Oswaldo Cruz (Icict/Fiocruz), nos dias 29 e 30 de setembro de 2015, nós, participantes do evento, profissionais, acadêmicos, instituições do campo da saúde e movimentos sociais, compartilhamos o presente documento. Tendo como referência este encontro, o objetivo é apresentar aqui reflexões e propostas debatidas, acrescidas de outras colaborações, para contribuir com os debates durante a 15ª Conferência Nacional de Saúde, entre 1º e 4 de dezembro deste ano, em Brasília.

Defendemos que a comunicação e informação sejam reconhecidas como direitos humanos, por serem estruturantes para os processos sociais e para a defesa e garantia do acesso a outros direitos, como à saúde. Para isso, propomos que a comunicação e a informação, no contexto da saúde, não sejam consideradas apenas como ações de caráter instrumental, por exemplo, de divulgação ou transmissão linear de uma mensagem de um emissor para um receptor, por meio de campanhas preventivas, informativos e outros recursos. Mas que a centralidade que ambas têm seja considerada nos processos econômicos, políticos e sociais, assim como nas relações de poder na sociedade. Portanto, a comunicação e a informação devem ser reconhecidas como direitos fundamentais e inalienáveis do direito à saúde e para avançar na efetivação da democracia. E as políticas e práticas em que estejam envolvidas devem ter como referência os princípios doutrinários do Sistema Único de Saúde (SUS), de universalidade, equidade e integralidade, bem como os organizativos de descentralização, hierarquização e participação. 

 

Democracia e participação social em saúde: desafios de comunicação e informação 

Destacamos, em primeiro lugar, o caráter central do debate sobre a democracia e a democratização do Estado para a saúde. Neste sentido, consideramos que os conselhos e as conferências são dispositivos de participação social que possibilitam a capilarização da defesa do direito à saúde no país e o fortalecimento do SUS. No entanto, para assegurar que as diferentes representatividades ocupem estes espaços participativos com a garantia da equidade e atuem para além destes instrumentos institucionais, é necessário investir em formação e estratégias de educação permanente para o exercício do controle social. A comunicação e a informação se tornam fundamentais nestes processos democráticos, a fim de qualificar a participação de conselheiros e assegurar transparência no acesso a dados para a gestão participativa em saúde.

Para o aprimoramento do diálogo entre conselhos de saúde e a população em geral, chamamos a atenção para a importância de se levar em conta nos processos comunicacionais a diversidade dos cidadãos e seus respectivos contextos culturais e histórias de vida. A importância da participação da população nos processos de produção de informação em saúde e de uma divulgação mais ampla sobre os espaços de participação institucionais e suas atribuições também precisa ser considerada. Para tanto, mais uma vez, a formação dos conselheiros de saúde é necessária, a fim de fortalecer a representação e participação dos diferentes segmentos nos espaços democráticos institucionalizados e para que estes não se tornem meros rituais participatórios na efetividade política, e assegurem a democratização das representações nos espaços participativos. Uma comunicação mais dialógica com o público em geral e dentro dos espaços de participação são caminhos para ampliar o reconhecimento das diferentes demandas e da pluralidade da população, reforçando o princípio da integralidade e a busca pela convergência e construção de consensos na defesa do direito à saúde. 

 

Política de comunicação para o SUS: descentralização, regionalização, articulação em rede e intersetorialidade  

A construção de uma política de comunicação para o SUS deve estar relacionada a seus princípios, como a descentralização e regionalização, ao potencial das redes baseadas nas tecnologias de informação e comunicação (TICs), e articulada a políticas intersetoriais, sobretudo às experiências no campo da cultura. Isto implica em assegurar processos de produção de informação e comunicação que permitam a participação direta de diversos grupos sociais e levem em consideração a diversidade de realidades e contextos, como ocorre com os Pontos de Cultura, coletivos certificados pelo Ministério da Cultura e que promovem uma agenda de diálogos e de participação em comunidades e territórios associados a segmentos mais vulnerabilizados. 

Outra referência importante para as políticas de saúde no contexto atual são as experiências de articulação em rede, fortalecendo a ideia de um interesse comum, valorizando as práticas bem-sucedidas de descentralização e potencializando o uso das novas TICs. Desta forma, é fundamental reconhecer as articulações possíveis a partir destes recursos tecnológicos e implementar iniciativas de “democracia digital” na área da saúde, ampliando o debate e a inteligência coletiva do SUS. É preciso também pensar e investir em ferramentas colaborativas e de participação social a partir das novas TICs, apoiando iniciativas neste sentido, tais como a Rede HumanizaSUS, Comunidades de Práticas e Telessaúde, fortalecendo os espaços democráticos de debate sobre políticas públicas de saúde, a circulação da informação e a consolidação do “CiberespaSUS”.

 

Comunicação e informação em pauta: o que isso tem a ver com a saúde

Conforme o conceito ampliado de saúde, formulado na 8ª Conferência Nacional de Saúde, comunicação e informação se relacionam com a saúde no campo dos direitos humanos. Estão associadas à redistribuição de recursos de poder e, portanto, à democratização do Estado. Neste sentido, é necessário reconhecer a informação e a comunicação como direitos fundamentais ao pleno exercício da cidadania e autonomização das instituições. E é urgente incluir na agenda da saúde propostas para a implementação de políticas e estratégias que corroborem para a democratização da comunicação, do acesso à informação científica e à internet, bem como para uma maior efetividade da Lei de Acesso à Informação (LAI). O caráter público da comunicação e da informação deve ser afirmado, confrontando a concentração de poderes da mídia, as empresas de telecomunicações, as grandes editoras científicas e a falta de transparência nos poderes públicos. 

É necessário reverter a lógica comercial que predomina no exercício dos canais de televisão e rádio, que, embora sejam concessões públicas, são ocupados quase que exclusivamente por emissoras privadas, em regime de monopólio, que restringem a liberdade de expressão, a diversidade e a pluralidade de vozes no debate público.  

 

Neste sentido, propomos:

1.     Maior participação do campo da saúde nos debates e nas definições das políticas relacionadas à internet, em defesa da/do: 
•    Universalização do acesso à internet de banda larga; 
•    Marco Civil da Internet e de seus princípios – neutralidade de rede, liberdade de expressão e privacidade; 

2.    Ampliação da participação nos debates sobre a democratização da comunicação e apoio a seguintes pautas: 
•    Novo Marco Regulatório das Comunicações;
•    Implementação dos canais públicos de televisão na TV digital aberta, em especial o Canal Saúde; 
•    Controle social da mídia, com a regulamentação da publicidade para as crianças e de produtos que possam colocar a saúde em risco (agrotóxicos, medicamentos, álcool, alimentos etc.);
•    Apoio às rádios e TVs comunitárias, redes colaborativas de comunicação, como forma de garantir a liberdade de expressão e a pluralidade de vozes na comunicação.

3.    Veiculação de uma programação comprometida com a formação cidadã nos meios de comunicação. 

4.    Defesa de políticas de acesso aberto ao conhecimento, como forma de democratizar o acesso à produção científica, o que implica na:
•    Aprovação de legislação, instituindo o acesso aberto à produção científica nacional financiada com recursos públicos;
•    Constituição de repositórios institucionais para estimular o depósito e a divulgação dos resultados das pesquisas na área da saúde;   

5.    Elaboração de medidas de promoção e de políticas que gerem maior efetividade da Lei de Acesso à Informação (LAI) nos âmbitos federal, estadual e municipal. 

6.    Criação de instrumentos de capacitação para servidores públicos, conselheiros e para a população em geral, sobre a importância da disponibilização de dados públicos e da Lei de Acesso à Informação (LAI).

7.    Desenvolvimento de estratégias de formação permanente de conselheiros de saúde, com o objetivo de reforçar o exercício da cidadania e o papel de espaços democráticos e de participação social para a defesa do SUS. 

8.    Criação de sistemas de informação para a gestão em saúde que assegurem transparência e amplo acesso a dados por atores sociais envolvidos nos processos de participação social.

9.    Desenvolvimento de dinâmicas participativas que gerem redes de articulação e mobilização social na formulação de políticas públicas.

10.    Garantia de mecanismos de comunicação mais dialógicos e participativos na produção e circulação de informação no SUS e que reconheçam a pluralidade dos cidadãos.

11.    Garantia de medidas de acessibilidade na circulação de informação e nos processos comunicacionais implementados no contexto das políticas públicas de saúde.

12.    Desenvolvimento de política de comunicação para o SUS, de forma cooperativa e intersetorial, com a valorização de iniciativas bem-sucedidas, a partir de realidades locais e com participação dos trabalhadores da saúde.

13.    Lançamento de editais conjuntos com o Ministério da Cultura para apoiar a promoção de diálogos sobre saúde nos territórios a partir dos Pontos de Cultura e dos Pontos de Mídia Livre. 

14.    Criação de ferramentas colaborativas e de participação social via internet, com o objetivo de construir espaços democráticos de debate de políticas públicas em saúde a partir das novas TICs, consolidando a ideia de um CiberespaSUS.